Entrevista: como era a vida na Alemanha Socialista? Um operário nos revela

Como era a vida na Alemanha Socialista? Ninguém melhor para nos contar do que um comunista que realmente lá nasceu e viveu, e que ainda hoje luta pelo socialismo. Entrevistamos Olaf, nascido e educado na República Democrática Alemã (RDA, ou Alemanha Socialista), e ainda hoje um operário comunista. Crítico do curso revisionista tomado pela RDA a partir de 1956, Olaf acredita que apenas o socialismo pode livrar a humanidade da barbárie, mas ressalta: este socialismo teria características diferentes do sistema praticado na RDA.

Você nasceu na DDR (RDA)? Em qual cidade, e quantos anos viveu lá?


Eu nasci em 1968, nas proximidades de Berlim, mas cresci em Weimar e região, na Turíngia. Passei minha infância e juventude ali com minha família. Obtive minha formação profissional como mecânico junto às atividades políticas legais (obrigatórias) do regime (e em parte também ilegalmente: pichações políticas). Eu vivi na DDR até o final dos meus 20 anos de idade.


Como foi sua infância na DDR?


Eu frequentei a clássica escola superior politécnica. Praticava esportes em meu tempo livre (futebol, judô, bicicleta). Meus pais se separaram cedo, então eu cresci com minha mãe e minhas duas irmãs. Como minha mãe trabalhava, eu cresci também com a ajuda de minha avó. Ela me ajudava muito na escola. Eu aprendi muito com ela sobre a 2ª Guerra Mundial, suas causas e consequências. Eu andava muito pela floresta da Turíngia (pra colher cogumelos e madeira); trabalhei muito no jardim para nosso próprio sustento, pois a provisão de todos os tipos de alimentos na DDR era incerta. A gente recebia às vezes “encomenda do oeste”, da Alemanha Ocidental. Ou então a vovó fazia visitas ao oeste – uma ocasião muito especial para nós. No verão, eu ia para as piscinas públicas e, no inverno, esquiava. Na época havia ainda muita neve na Turíngia! 

Eu era ativo na FDJ (Pioneiros), na DSF (Amizade Alemã-Soviética) e também em associações de esportes. Participava também da “Estação de jovens técnicos e pesquisadores” em meu tempo livre, como atividade de extensão escolar – um lugar no qual a juventude e os cientistas se encontravam. A mesma coisa com os jogos anuais da Juventude Espartaquista. Ou então na formação paramilitar da juventude na GST (Juventude para o Esporte e a Técnica).

Eu lia muito e tentava buscar toda informação possível sobre os países do mundo. Na época não havia internet, computador ou telefone. Então comecei a me interessar por política, geografia e etnografia. Gostava sobretudo de livros do Jack London, Miloslav Stingl e Thor Heyerdahl, Darwin ou Humboldt. Com cerca de 13-14 anos comecei a ler os clássicos do marxismo-leninismo e a desenvolver minhas próprias ideias na escola, pois eu também ouvia rádio e assistia à TV do ocidente (para ter informações sobre o mundo).

Em minha formação profissional gostava de ouvir música dos anos 1980, mas também blues. Também aprendi handball e boxe. No boxe (e no baseball) tive longos contatos com trabalhadores estrangeiros cubanos e aprendi mais sobre a revolução, Che e José Martí. Aqui também havia discussões críticas, pois os cubanos na DDR não estavam felizes!


Como eram as escolas, o tempo livre, a televisão, as brincadeiras?


As escolas estatais eram concebidas como Escolas Superiores Politécnicas (POS), com obrigatoriedade escolar para todos. Os livros eram todos gratuitos e pagava-se pouco pela comida. Havia poucas escolas privadas ligadas à igreja. 95% de todas as escolas da DDR seguiam o modelo das POS, sendo o ensino igual para todos até a 10ª série. Assim foi também comigo. Após a 10ª série eu comecei a formação profissional. Havia também a EOS – a Escola Superior Continuada – até a 12ª série. O acesso à EOS me foi negado, pois minhas concepções políticas não estavam “de acordo com o sistema”. Eu falava sobre as contradições da DDR abertamente!

As escolas eram organizadas com turmas de 20-25 alunos, e as aulas tinham muitos exercícios. Também no período da tarde havia educação física ou atividades políticas obrigatórias e atividades facultativas (inglês, por exemplo). Uma matéria obrigatória na escola era russo!

Como falei: no tempo livre eu praticava esportes, mas tinha também obrigações familiares, fazia compras, jardinagem, ganhava dinheiro (recolhendo recicláveis) e correrias de todo tipo para fazer uma “caixinha”.

Havia na escola, a partir da 7 série, as matérias “Trabalho produtivo” e “Introdução à produção socialista”. Duas “matérias” que o estado utilizava para fazer os jovens trabalharem para si (em empresas reais), e também para prepará-los para o trabalho.

A televisão da DDR tinha apenas dois canais, mas havia também dois canais do leste (ARD, ZDF). A televisão da DDR era muito entediante (exceto o futebol) e na maioria das vezes muito distante da vida real das pessoas simples. No rádio eu gostava de ouvir a rádio americana da Berlim ocidental RIAS. Foi assim que aprendi a traduzir textos do inglês. Eu gostava de jogar futebol com os amigos no verão e frequentava as piscinas públicas. No inverno íamos frequentemente esquiar, ou ao cinema. Gostava de ir a shows de blues, pois havia muitos fãs do estilo entre nós (Weimar tinha uma famosa escola de música e bons clubes para estudantes).

Quase todas as crianças tinham brinquedos, jeans, discos e coisas afins que vinham do ocidente, os quais eles gostavam de compartilhar com os amigos no tempo livre. Na escola a gente aprendia desde cedo a matéria “Trabalhos”, a qual ajudava muita gente depois a conseguir uma vaga nas indústrias ou oficinas. Como costumávamos dizer na época: “fazer ouro a partir de esterco”, pois na DDR faltava frequentemente ferramentas ou matéria-prima.


Havia educação política na escola?


Havia tanto uma aula de história fortemente política quanto uma matéria - odiada por todos - chamada “Cidadania”, a partir do ensino médio. Esta era quase sempre ministrada por membros do partido SED nos coletivos de professores. O objetivo dessas matérias era desenvolver nos alunos um caráter socialista, o que raramente acontecia, pois todos tínhamos nossas próprias opiniões assim como discussões frequentes em casa. A maioria dos professores, no entanto, se dava por satisfeita quando os alunos decoravam o conteúdo. Quem se posicionava criticamente, como eu, tirava notas ruins, ou até mesmo suspensão, como ocorreu comigo. Pois eu lia os clássicos (Marx, Engels, Lenin) e não apenas decorava. Então eu criticava nas aulas: o Muro, as eleições controladas, o abastecimento insuficiente, os privilégios dos “Bonzen” ou também a invasão do exército vermelho ao Afeganistão. Mas eu apoiava a luta de libertação na Nicarágua, na Palestina ou na África do Sul. Fazia parte de nossa formação antifascista visitas ao campo de concentração de Buchenwald, próximo a Weimar, ou ao teatro nacional, na mesma cidade. Religião era coisa privada e proibida na escola. Isso fazia parte de um estado “ateu”.


Como era a questão da segurança?


Como a DDR era fechada pelo Muro, completamente vigiada pelo serviço secreto do estado e havia muitos policiais e espiões, a criminalidade era muito baixa. Os principais criminosos, quando avaliamos  hoje, eram o próprio estado, os seus “Bonzen” (muitos servidores públicos), a Nomenklatura que se enriquecia com a propriedade do povo e os altos funcionários do partido, que tinham dinheiro da Alemanha Ocidental (BRD), podiam viajar para lá e fazer compras nas “Intershop”, ou que tinham acesso à Genex. Ou que ganhavam tanto dinheiro que podiam comprar mercadorias raras e mantimentos nas lojas especiais da DDR. Mas também colegas se “serviam” nos negócios...

Segurança no emprego era garantida a praticamente todos. Exceto para os “antissociais”, ou para pessoas que oficialmente requisitavam uma permissão de viagem (como minha mãe) ou que protestavam contra o regime – estes não tinham nenhuma segurança. Estes poderiam ser presos a qualquer momento!


E como era a política de saúde e os hospitais?


Havia "policlínicas" e hospitais em todos os lugares. Os medicamentos eram gratuitos para todos, raramente você tinha que pagar por alguma coisa. Todo mundo tinha plano de saúde! Apenas para certos tratamentos especiais era necessário pagar do próprio bolso.  Os cuidados de saúde eram bons: desde o jardim de infância e a escola, havia os chamados “exames de triagem” (também dentista), que implementavam a exigência de vacinação do estado e ensinavam todas as crianças e adolescentes em higiene e educação em saúde. Isso era continuado mais tarde na formação profissional (e na vida profissional) e registrado na carteira de trabalho. A partir da 7ª série havia “educação sexual”: muito aberta e educativa. A contracepção era ensinada, assim como um relacionamento aberto e justo entre meninos e meninas. A homossexualidade não era abordada! Oficialmente, havia até uma seção sobre punição no H.S. - que foi abolido apenas nos anos 1980. Havia uma educação sobre AIDS na RDA no final dos anos 1980, mas não oficialmente, pois ela era conhecida como uma "doença sexualmente transmissível", mas ainda não havia sido pesquisada cientificamente. Minha mãe era enfermeira e eu costumava ir à clínica para vê-la no trabalho. Então, aprendi muito sobre o sistema de saúde em todas as suas facetas. Muitos estrangeiros foram tratados em clínicas especiais da RDA (por exemplo, cirurgia cardíaca) – em moeda estrangeira!


Como era a política habitacional? Havia pessoas sem casa? Havia mendigos nas ruas? As casas eram próprias ou alugadas pelo estado?


A maioria (cerca de 80%) da população trabalhadora simples vivia em "edifícios pré-fabricados", em conjuntos habitacionais ou em casas do estado, com um aluguel baixo. Eles pertenciam ao estado, à cidade ou a uma combinação dos dois. As famílias que herdavam, construíam ou compravam uma casa eram em sua maioria privilegiadas e/ou possuíam divisas ou outros "relacionamentos". Somente nos anos 1980 é que a situação da moradia se tornou boa para muitas pessoas. Havia muito poucos "sem-teto"; só aqueles que não queriam morar em casas. Eles moravam em gazebos (casas de jardim) ou em trailers; Os jovens e as pessoas "alternativas" ocupavam casas destruídas para protegê-los contra a demolição (o que era ilegal, mas muitas vezes tolerado).


Você me contou certa vez que foi preso na DDR. O que aconteceu?


Tendo em vista que minha mãe fez um “pedido de saída” e nós, filhos, também tínhamos que fazer isso depois de atingirmos a maioridade, eu enviei um quando tínhamos 18 anos. Meu pedido foi rejeitado após dois anos, de modo que não me foi possível sair legalmente do país. Eu não queria ficar na RDA, era um regime sem liberdade para mim. Naquela época, a única saída me parecia ser deixar o país “ilegalmente”, o que era chamado na linguagem cotidiana de “Republikflucht”! Passei férias na Bulgária em 1988 e queria cruzar a fronteira com a Turquia. Fui pego na fronteira e levado de volta à prisão na RDA. Segundo o “Acordo de Helsinque” (1975), ratificado pela RDA, deixar o país não seria crime. Claro, o estado não aderiu a isso - pelas mesmas razões pelas quais o muro foi construído em 1961. Fui condenado a um ano de prisão por "fugir da república" e fiquei 6 meses preso. Depois de meio ano fui "resgatado" pelo governo da RFA (Alemanha Ocidental) - 100.000 DM (moeda estrangeira) para o governo da RDA ... por meio do escritório de advocacia Vogel em Berlim Oriental!

Fui "deportado" para a Alemanha quando o Muro ainda existia - no início de 1989. Morei na Alemanha Ocidental desde então. Muitos membros da minha família vieram mais tarde para o “Ocidente”. A prisão foi uma época difícil, e minha saúde foi prejudicada. Na RFA fui reconhecido como “preso político”, legalmente reabilitado, recebi “indenização” financeira e auxílio para recuperação.


Por que você quis fugir do país?


Eu apoiei parcialmente o sistema da RDA e a ideia de que era um “socialismo real”, mas também vivi e apontei todas as contradições que eu percebia, o que me trouxe muitos problemas. A partir de 1987, não estava mais convencido de que vivia em um país livre ou em um estado “socialista”. É por isso que eu queria ir para a “liberdade". Mudar o sistema não era possível na época porque todas as oposições eram perseguidas e reprimidas, com algumas exceções (grupos religiosos). Ninguém poderia imaginar, um ano antes, que as coisas ocorreriam tão rápido como foi em 1989, com a queda do Muro de Berlim, a queda da ditadura do SED e a desintegração interna do aparelho de Estado. E isso mesmo com os grandes protestos que já se espalhavam pela população em meados dos anos 80 (petições, pedidos de saída do país, discussões em escolas e empresas, em grandes shows em Berlim e em protestos ambientais). Milhões de pessoas na RDA estavam insatisfeitas com o estado, com o governo e com uma economia quebrada: toda a falta de liberdade política e pessoal. Acima de tudo, o povo estava farto de “debater frases”, paternalismo e opressão. Muitos simplesmente sentiram que o sistema estava "no fim"... mas por muito tempo ninguém quis "dar o primeiro passo"!


Por que foi criado o Muro de Berlim?


Na antiga “zona de ocupação soviética” (no território da RDA), os primeiros passos em direção a uma “democracia popular” foram dados sob a liderança da então ainda socialista União Soviética e de Stalin. Junkers, criminosos de guerra e fascistas foram expropriados e punidos (não todos). Houve uma “reforma agrária”, mas foi ordenada de cima para baixo (sem ampla discussão e conscientização) - em parte com a violência da “administração”. Partidos democráticos e sindicatos antifascistas eram permitidos. Mas tudo foi feito muito rapidamente, de forma prematura e sem uma consciência revolucionária das massas, como por exemplo o processo de unificação do KPD e partes do SPD sob pressão e coerção, mesmo com os avisos de ambos os partidos e sindicatos.

Quando Stalin morreu em 1953, mais e mais “burocratas do partido” tomaram a dianteira na RDA: funcionários que não tinham consciência revolucionária ou de classe e estavam exilados na SU durante a guerra, como Ulbricht (que mais tarde mandou construir o muro). Ao contrário de Thälmann, proletário e presidente do KPD assassinado no campo de concentração de Buchenwald em 1945, eles não tinham experiência real na luta de classes revolucionária. Esses burocratas queriam prescrever a introdução do socialismo a partir de uma “ordem democrática popular”, “de cima para baixo”. Assim, em 1953, ocorreu a “revolta popular de junho”, na qual grande parte da classe trabalhadora protestou contra as normas excessivas de trabalho, os baixos salários e certa escassez de víveres (justificado). Isso foi usado ao mesmo tempo pela "inimiga de classe" (Alemanha Ocidental) e pelo imperialismo estadunidense para provocar e às vezes também para iniciar a sabotagem (por exemplo, no "triângulo da química") e para iniciar uma ampla propaganda anticomunista contra o "socialismo real" (como no filme One, Two, Three de Hollywood (1961)).

Após a derrota do levante de junho de 1953, no qual o Exército Soviético "varreu" os protestos com tanques e unidades de fuzil motorizadas nas ruas (com mortos e feridos), e no qual a "polícia" e o serviço secreto russo NKVD agiram contra os "contrarrevolucionários", negando assim o protesto justificado das  massas, o povo começou então a fugir em massa para o oeste. A RDA havia perdido a luta entre os dois “sistemas” da época (no chamado “voto com os pés”). É por isso que o muro foi construído, para evitar que a RDA “sangrasse”, caso contrário, a guerra poderia ter estourado. Com essa medida ditatorial contra a população, os refugiados foram prejudicados, mas também ficou claro para todos que o povo não tinha poder, tal como deve ser no socialismo verdadeiro (a “ditadura do proletariado”). Os burocratas do partido SED assumiram os negócios na política, na administração, e a partir de meados da década de 1950, o caminho para um estado “socialista” foi interrompido (até então, a “ordem democrática popular” era usada como uma fase de transição).


Na sua opinião, a DDR foi um estado socialista?


Como eu disse, quando adolescente eu não estava totalmente convencido. Então, com a idade de 16/17 anos, ficou claro para mim que aquele não era um socialismo “verdadeiro”. Lá pude conhecer a prática e a luta de classes nas fábricas/canteiros de obras, a forma como os "Apparatchiks" sufocavam qualquer iniciativa. Havia uma piada na RDA que resumia a situação da seguinte forma: "No capitalismo, o homem é explorado pelo homem - no socialismo real é exatamente o contrário!"

Hoje eu sei: em 1945, na área da “zona de ocupação soviética”, havia a esperança de uma alternativa em direção a uma “ordem democrática popular”; de 1953 a 1956, isso acabou se transformando em um “capitalismo burocrático”, não obstante as conquistas sociais, as reformas políticas e todas as “frases” socialistas que se fizeram presentes até o final (1989).


Qual a sua avaliação política sobre o revisionismo na DDR? Quando começou? Teve alguma relação com o revisionismo na União Soviética?


Recomendo a todos os interessados na RDA o livro Socialismo no fim?, de Willi Dickhut (da editora https://www.neuerweg.de). Após a reunificação da Alemanha, conheci o MLPD (Partido Marxista-Leninista da Alemanha) e a obra de Willi Dickhut. Mas também as obras de Stalin e Mao, que não eram acessíveis na RDA! Quando li os 2 volumes da biografia de Dickhut, tudo o que experimentei na RDA fez sentido. Todas as contradições foram resolvidas com a ajuda da crítica dos princípios e da autocrítica. Um camarada do MLPD, que conheci na época, ajudou nisso. Também um trabalhador como eu!

O revisionismo na RDA residia na falta de fundamentos ou de consciência de classe, de consciência socialista na classe trabalhadora quando a RDA foi fundada como um estado. Não houve revolução ou partido revolucionário de massas que destruiu o velho estado. A “Nova Ordem” foi dirigida e controlada pela administração da ocupação soviética em 1945. Entre outras coisas: a união sem princípios de KPD e SPD trouxe carreiristas, burocratas, socialdemocratas e todas as suas formas de pensar e sentimentos pequeno-burgueses, moral e prática em primeiro plano, o que também levou à degeneração na liderança do partido e do estado de 1953 a 1958 (5º congresso do partido do SED). O desejo sincero de unidade antifascista após a guerra encobriu os erros cometidos pelo KPD e SPD antes da guerra em ambos os lados (e crítica honesta e aberta e autocrítica para esclarecer as causas da tomada do poder por Hitler) e não poderia educar as massas, assim, para fornecer essas formas socialmente necessárias de consciência e discussões após a guerra. “Vanguarda” funciona de forma diferente!

A URSS também se tornou, a partir XX congresso do partido em 1956 sob Kruschev, um regime burocrático-capitalista. A liderança do Partido Comunista sob Stalin já havia mostrado desenvolvimentos “críticos” durante e após a Segunda Guerra Mundial. Isso não foi culpa dele sozinho!


No episódio da queda do Muro de Berlim, havia grandes protestos de massas. O que essas massas queriam? Quais eram as pautas concretas? Você acha que houve interferência da CIA ou dos países capitalistas?


As massas queriam liberdade de viagem e expressão, eleições livres e mídia sem censura. Livre escolha profissional, liberdade religiosa, proteção ambiental e, alguns, um “socialismo humano”; o regime do SED e do serviço secreto deveriam ser dissolvidos e os assassinatos no muro deveriam ser julgados!

O lema principal era: “Nós somos o povo!”. Muitos também estavam com medo de tomar as ruas, já que o massacre em Pequim ocorrera meses antes na praça Tieanamen. Mas muitos outros cidadãos da RDA não tinham mais medo e estavam prontos para sacrificar suas vidas. Eu também me sentia da mesma forma.

Em caso de massacre, poderia ter havido uma guerra civil na RDA. Todos tinham medo disso na época, especialmente os figurões do SED, a segurança do estado e a liderança do NVA (Exército Nacional do Povo).

Depois de alguns meses (já era 1990), o governo da RFA (Alemanha Ocidental) e o capital monopolista viram sua chance: como a União Soviética, a "potência protetora" da RDA, revelou um regime mórbido com a “Glasnost & Perestroika” de Gorbachev, bastou um acordo de bilhões de dólares para que a URSS deixasse livre o caminho para a “reunificação”. E isso continua a ter efeitos até hoje (ver anexo da Crimeia + “Nord Stream II”).

A partir da primavera de 90, o slogan “Somos um só povo” se espalhou a partir das mídias ocidentais em toda a Alemanha Oriental (jornal Bild!). Os serviços secretos de França, Inglaterra e EUA tentaram, através tanto da mídia (RIAS, BBC, Radio France) quanto através de outros canais (econômico-políticos, culturais e diplomáticos) influenciar a reunificação em seu favor.

Os partidos ocidentais compraram sua entrada nas lideranças dos partidos e movimentos civis da RDA, a fim de que a primeira eleição “livre” na RDA (março de 1990) pudesse realizar o que o capitalismo da Alemanha Ocidental e o capital financeiro internacional desejavam, como a “reforma da moeda” em junho de 1990, por exemplo. Assim, a “história da RDA” foi reescrita pelos vencedores e o estado foi liquidado! Uma tremenda onda de anticomunismo moderno espalhada sobre todo o país ainda hoje se faz sentir.


Havia uma oposição marxista-leninista na DDR?


Todas as tentativas anteriormente conhecidas de “comunistas” ou “marxista-leninistas” da Alemanha Ocidental para começar um trabalho na RDA nos anos 70 ou 80 foram rapidamente cortadas pela raiz pelo “Serviço de Segurança do Estado”. Mas eu só conheço esses casos através de terceiros.


Que autocrítica a esquerda deve fazer sobre a DDR? Que ensinamentos podemos extrair desta experiência?


A “esquerda” na Alemanha (quero dizer o partido Die Linke e o DKP) nunca comentou de forma honesta, aberta e voluntária sobre os erros políticos da RDA (ou URSS), os crimes da "Staasi", as tropas de fronteira e a escassez burocrática na economia – apenas alguns camaradas fizeram isso, mas de forma individual. Sobre a degeneração burocrática, a traição da estrutura socialista e a mudança para o regime burocrático-capitalista, nada se ouviu de ambos.

Eu mesmo reconheci, entre outros, nos ensinamentos de Mao (revolução cultural) e de W. Dickhut em seu livro Restauração do Capitalismo na União Soviética ensinamentos importantes para a construção de um partido marxista-leninista revolucionário, de um verdadeiro socialismo, para a revolução e a ditadura do proletariado. 

Um conselho importante que daria é: trabalhar juntos internacionalmente, aprender com a experiência de todos os revolucionários, não repetir os erros dos outros, o que é a essência da “doutrina do modo de pensar”. Esta pedra fundamental do pensamento de Willi Dickhut e do MLPD é muito importante, também a nível mundial (fundação do ICOR)! Já são 50 anos de construção de um partido revolucionário em um país imperialista como a Alemanha, e estamos procurando nossos iguais em todo o mundo!