Socialismo: um mundo sem opressão

Karl Marx não foi o primeiro socialista. Ele não foi o primeiro a prever um futuro comunista, sem a opressão e a degradação a que o povo está submetido.

No entanto, Marx foi o primeiro a entender que o socialismo só poderia ser o resultado da luta de classes. A classe capitalista, que detém os bancos, fábricas e vasta riqueza da sociedade, está constantemente em luta com a classe trabalhadora, com aqueles que não possuem nada para vender a não ser sua força de trabalho.

Karl Marx também apontou que "a ideologia dominante de uma época é a ideologia da classe dominante dessa época". Assim como as ideias que dominavam durante o feudalismo eram as ideias dos reis e dos nobres, as ideias que prevalecem no mundo agora, através da propriedade privada da mídia, são as ideias dos capitalistas e dos banqueiros.

Por essa razão, mentiras descaradas são apresentadas como sendo a realidade.

Uma mentira que tem sido comumente aceita é a de que o socialismo é uma boa ideia, mas que falhou em todos os lugares em que foi experimentado. Na verdade, é exatamente o contrário. Em todos os lugares em que o socialismo foi implementado os resultados significaram grandes vitórias e avanços para o povo.

Na União Soviética, onde nossa classe tomou o poder pela primeira vez, o analfabetismo foi abolido. O desemprego foi eliminado. As primeiros naves espaciais a orbitar a Terra foram lançadas, fazendo do povo soviético o primeiro a "conquistar os céus", como alguns dizem.

Tudo isso foi conquistado apesar de os imperialistas nunca darem à URSS um momento de paz. Quer fossem as forças enviadas imediatamente após a revolução para abortá-la, quer seja a invasão nazista ou a ameaça de aniquilação nuclear pelo presidente Ronald Reagan, o povo soviético fez tudo o que fez debaixo de extremas ameaças da classe capitalista mundial.

Hoje Cuba resiste como um exemplo de uma sociedade socialista. Cuba tem a maior expectativa de vida da América Latina e uma taxa de mortalidade infantil menor do que a dos EUA.

Em janeiro Cuba celebrará seu 50º aniversário sem analfabetismo, pois depois da revolução o governo cubano enviou a juventude para o campo a fim de educar o povo. [Em abril de 1961 Cuba lançou a Campanha de Alfabetização Nacional.] O objetivo era armar o povo com a capacidade de ler e aprender, de forma que eles pudessem governar a sociedade, e não uma classe capitalista ou uma burocracia.

Qual é a falha nisso?

Uma outra mentira nos diz que o imperialismo está ajudando o mundo. Acabamos de ouvir sobre os crimes que o imperialismo está cometendo contra as mulheres ao redor do mundo.

Quando você compara os vários países onde o imperialismo detém o poder, vê-se uma opressão brutal. Na Nigéria, onde a Shell detém o governo, o resultado é desemprego em massa, desnutrição e falta das necessidades básicas.

No entanto, a mais alta expectativa de vida da África está na Líbia, onde um governo nacionalista tomou o controle do petróleo e o usa para o bem do povo. Eu concordo com Vince Copeland, um fundador do nosso partido, que é hora de fazermos o mesmo porque o petróleo pertence ao povo!

Outra mentira que nos dizem é que este é o maior país do mundo e que os trabalhadores nos EUA estão em melhores condições do que os trabalhadores de qualquer outro lugar. Isso é falso.

Em países com fortes sindicatos e partidos socialistas e comunistas, muitos trabalhadores já conquistaram inúmeras concessões. Sistema de saúde nacional, melhores salários e educação gratuitas beneficiam os trabalhadores em países imperialistas, resultando disso uma maior expectativa de vida, uma menor taxa de mortalidade infantil e uma melhor qualidade de vida.

O grande revolucionário Frederick Douglas disse: "O poder não concede nada sem luta."

Nós, como um partido revolucionário, temos que nos envolver em cada luta por direitos básicos e justiça. Além do mais, precisamos trazer ao povo nossa mensagem revolucionária de que os trabalhadores podem se insurgir e construir o futuro que todos merecem.

Tradução de Glauber Ataide

Excertos de uma intervenção de Caleb T. Maupin na conferência do Workers World Party em Nova Iorque.

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Escritora Ana L. Strong escreve sobre Stálin

José Stálin ou Iosssif Vissariónovictch, nasceu no ano de 1879, em Gori, Geórgia. Após a morte de V. I. Lênin, Stálin foi o principal dirigente do Partido Comunista (Bolchevique) da União Soviética, desempenhando um papel destacado na construção do socialismo na URSS e na derrota do nazi-fascismo na II Guerra Mundial, evitando, assim, a escravidão da humanidade por Hitler e a morte de milhões de pessoas. Em 5 de março de 2003, completaram-se 50 anos da sua morte. Em homenagem a este que foi um dos maiores dirigentes do proletariado internacional, A Verdade publica o artigo Stálin, da jornalista norte-americana Ana Louise Strong.



Faz alguns anos, quando, pela primeira vez, almocei com o presidente Roosevelt, que acabava de ter uma entrevista com H. G. Wells, me certifiquei de que o assunto que mais o interessava sobre a União Soviética era o relacionado com a personalidade de Stálin e, em particular, a técnica de governo de Stálin. Era um interesse natural, e creio que o assunto interessa à maioria dos norte-americanos. O crescente prestígio de Stálin, durante os últimos vinte anos, tanto dentro da União Soviética como além de suas fronteiras, merece, realmente, a atenção de todas as pessoas que se preocupam com a política.
Apesar disso, a imprensa norte-americana dá mostras de sua total ignorância a respeito de Stálin ao referir-se, como o faz freqüentemente, "ao enigmático mandatário do Kremlin". Recorreu-se a toda espécie de pérfidas insinuações e de caricaturas tendenciosas para criar a lenda de um ditador astuto e sanguinário, que pretendia lançar o mundo no caos e na guerra, a fim de que uma coisa que denominam de "bolchevismo" pudesse alcançar o triunfo. Essa lenda absurda está destinada a ser em breve destruída. Nasceu do fato de que a maior parte dos escritores norte-americanos não estavam dispostos a fazer um pouco de esforço para compreender a União Soviética e de que, por outro lado, o próprio Stálin se mantinha inacessível à maior parte dos jornalistas estrangeiros. Pes-soas para quem se abriam as portas dos lugares mais altos do mundo e que po-diam conversar amigavelmente com Winston Churchill, Adolf Hitler, Benito Mussolini, Franklin D. Roosevelt e até com Chiang Kai-shek, sentiam-se profundamente irritadas ao ser-lhes negada uma entrevista com Stálin.

A verdade, porém, era que Joseph Stálin estava demasiado ocupado numa tarefa para cuja realização em nada podiam contribuir nem os contatos pessoais com estrangeiros nem a publicidade. Sua tarefa, como a de um presidente do Partido Democrata, consistia em organizar o Partido dominante e, por seu intermédio, o país inteiro. Desde que principiou a guerra germano-soviética, Stálin se converteu em chefe do exército e do governo. Agora pode receber o maior número de estrangeiros. E começou muito bem com Harry Hopkins e W. Averell Harriman. Ambos, ao que parece, ficaram vivamente impressionados. E compreendo o fato porque eu também falei com Stálin. A lenda do ditador inacessível morrerá à luz das impressões que sobre ele iam formando norte-americanos e ingleses destacados. E não seria difícil que chegássemos a ouvir falar de Stálin como sendo o "maior democrata do mundo", segundo o qualificou, em certa ocasião, um escritor soviético.

Quando falei com Stálin não achei que fosse um homem enigmático. Pareceu-me uma pessoa com quem é muito fácil manter contato. É o melhor presidente de comitê que conheci em toda a minha vida. Possui o dom de dar a conhecer os pontos de vista de cada um e saber combiná-los num mínimo de tempo. Seu método de dirigir um comitê faz-me lembrar Jane Addams, de Hull House, ou Lilian D. Wald, de Henry Street Settlement. Possuíam a mesma técnica eficaz e democrática, conquanto recorressem a uma pressão maior que Stálin.

Ainda que tenha sido inabordável pelos estrangeiros com raras exceções isto não significa que vivesse isolado, numa espécie de torre de marfim do Kremlin. Cerca de duzentos milhões de pessoas o mantinham ocupado. Com muitas se entrevistava. Nem sempre eram elementos do Partido. Uma camponesa que tivesse superado o recorde na ordenha; um homem de ciência que tivesse desintegrado o átomo; um aviador que tivesse voado até a América; um mineiro que tivesse inventado um novo processo de trabalho; um operário que enfrentasse um problema do alojamento; um engenheiro com dificuldades nascidas de uma nova situação; toda pessoa que representasse um triunfo notável ou um problema típico podia ser convidada a trocar impressões com Stálin. Dessa maneira, obtinha informações e mantinha-se em contato com o ritmo do país.

Como conheci Stálin

Essa foi a causa (de que só tive conhecimento posteriormente) de minha entrevista com Stálin. Durante cerca de dez anos havia-me interessado pela URSS e havia feito esforços para triunfar ali; de dois anos para trás, eu havia organizado e vinha editando um pequeno semanário destinado aos outros norte-americanos que trabalhavam no país, colaborando no primeiro Plano Qüinqüenal. Encontrava-me a ponto de abandonar a empresa, por causa da censura, dos entraves burocráticos e devido ao aparecimento de outro semanário rival. O diretor de meu semanário praticamente fazia uma chantagem comigo, pois ameaçava destruir minha reputação caso eu renunciasse.

Um amigo russo aconselhou-me então que me queixasse a Stálin. Assim o fiz. Três dias depois recebi um chamado de seu escritório sugerindo-me que passasse lá para falar com alguns "camaradas responsáveis". O convite tinha um caráter tão protocolar que me senti tentada a recusar, pois o meu diretor já se havia resolvido a aceitar minha renúncia e eu tinha dado por terminado o assunto. Pensei, no entanto, que, depois de haver enviado a carta, devia comparecer à entrevista, quando mais não fosse, por motivos de cortesia.

Esperava encontrar-me com algum funcionário, mais ou menos importante, no escritório do Partido, e senti-me aniquilada quando o carro se encaminhou diretamente para o Kremlin e, sobretudo, quando ao entrar num amplo salão de conferências não só me encontrei com Stálin, que se pôs de pé para saudar-me, mas, também, com Kaganovich e Voroshilov. A reunião pareceu-me extraordinariamente desproporcionada para a importância do assunto, mas, depois, compreendi que não era meu pequeno problema pessoal que lhes interessava. Eu era um dos milhares de norte-americanos que começavam a preocupá-los. Tínhamos ido à União Soviética para trabalhar em suas indústrias; éramos bastante honrados e capazes, mas não progredíamos. Stálin desejava saber por que não nos ajustávamos às necessidades da indústria soviética. Ao investigar minhas dificuldades, poderia averiguar a razão de nosso êxito na terra soviética, embora mais freqüentemente nos sucedesse o contrário. Mas se ele, por meu intermédio, aprendeu alguma coisa a respeito dos norte-america-nos, eu dele aprendi alguma coisa igualmente importante: qual é o processo de integração da União Soviética e como trabalha Stálin.

Minha primeira impressão sobre ele foi vagamente desfavorável. Um homem robusto, vestido com um simples uniforme cáqui, franco, modesto, cuja primeira preocupação foi a de saber se eu entendia o russo suficientemente para tomar parte de uma discussão. Achei que não possuía a imponência de uma grande homem. Sentamo-nos então de maneira tão pouco protocolar que Stálin nem sequer se instalou à cabeceira da mesa, que foi ocupada por Voroshilov. Stálin tomou lugar num assento de onde podia ver os rostos de todos nós. Iniciou a conversa fazendo uma pergunta direta ao homem de quem me havia queixado e imediatamente se colocou numa espécie de segundo plano, ouvindo os comentários dos demais. Subitamente, manifestaram-se o engenho brilhante de Kaganovich, as risadinhas alegres de Voroshilov e as características das pessoas de menor categoria que foram consultadas. Principiei a entendê-los melhor e sentir-me atraída para eles, inclusive o diretor de quem me havia queixado. Inesperadamente, surpreendi-me falando e expressando meus pontos de vista com maior rapidez e clareza do que nunca. Os que me escutavam pareciam estar de acordo. E, assim, chegamos sem tropeços ao miolo da questão, tendo Stálin falado menos que todos os presentes na reunião.

Depois, examinando mentalmente a entrevista, compreendi que a habilidade de Stálin para escutar nos havia ajudado a todos nos expressarmos e compreendermos melhor. Freqüentemente, fez-me repetir algumas de minhas palavras, dando-lhe uma entonação interrogativa ou uma ligeira ênfase. Isso fazia-me sentir que eu não havia compreendido bem algum ponto, ou que o havia exagerado e, assim, induzia-me a ser mais explícita. Com os demais, havia procedido da mesma forma. Compreendi, então, que sua maneira de escutar possuía um força dinâmica.

O hábito de escutar de Stálin data dos primeiros dias de sua carreira revolucionária. "Lembro-me disso perfeitamente, desde os primeiros tempos do nosso Partido" declarou-me um bolchevique veterano. "Era um jovem silencioso, que não se sentava ao centro do comitê, que falava pouco, mas escutava muito. Ao terminarem as discussões, fazia breves comentários e, às vezes, formulava apenas algumas perguntas. Gradualmente, começamos a compreender que ele fazia sempre o melhor resumo de nossos pensamentos".

Todo aquele que conhecer Stálin reconhecerá que essa opinião é exata. Em qualquer grupo, geralmente, é o último a expressar sua opinião. Procura não impedir a livre e completa expressão dos demais, como poderia fazer facilmente, falando em primeiro lugar. Além disso, aprende escutando: "É capaz de escutar até como cresce a erva" disse-me um cidadão soviético.

O homem de aço

Com as informações assim obtidas, Stálin chega a conclusões, não "através da solidão da noite", segundo afirma Emil Ludwig a respeito de Mussolini, mas conferenciando e discutindo. Nas entrevistas, raramente recebe o visitante sem estar acompanhado de algum auxiliar; quase sempre estão presentes Molotov, Voroshilov e Kaganovich. É possível até que não conceda uma entrevista sem antes discutir o assunto dela com seus camaradas mais íntimos. É um hábito adquirido há muito tempo. Nos dias do movimento revolucionário subterrâneo, acostumou-se ao trabalho de estreita cooperação com camaradas que tinham em suas mãos as vidas alheias. Para sobreviver, era necessário que aprendessem a porem-se todos de acordo rapidamente, chegando até a adivinhar os pensamentos à distância. Foi entre esse grupo que conquistou seu nome atual: Stálin ("o homem de aço").

O povo soviético tem uma forma de expressar a característica de Stálin, a qual pode parecer estranha aos norte-americanos. Diz-se que "Stálin não pensa individualmente". Mas estas palavras têm um supremo sentido elogioso. Isso quer dizer que Stálin não só pensa com o seu próprio cérebro, mas também com os cérebros da Academia de Ciências, dos chefes das indústrias, da Confederação dos Sindicatos, dos dirigentes do Partido. Assim é que pensam os homens de ciência e também os bons sindicalistas. Não pensam "individualmente"; não se apegam às conclusões de um só cérebro. É esse um processo extraordinariamente útil, pois hoje em dia não existe cérebro humano com poder capaz de resolver os complexos problemas do mundo. Somente será possível encaminhar esses problemas atuais mediante o trabalho conjunto de muitos cérebros, não em conflito, mas em estreita cooperação.

O próprio Stálin fez essa afirmação por vinte vezes, a diversas pessoas que o entrevistaram. Quando Emil Ludwig e, posteriormente, Roy Howard, quiseram saber "como chegava às suas conclusões o grande ditador", Stálin disse-lhes: "As pessoas, isoladamente, não podem decidir. A experiência tem-nos ensinado que as decisões individuais, que não são controladas por ninguém mais, contêm uma grande percentagem de erro".

Os habitantes da URSS não se referem nunca "à vontade de Stálin", nem "às ordens de Stálin"; falam das "ordens do governo" e da "linha do Partido", que são resoluções tomadas coletivamente. Mas falam com muita freqüência do "método de Stálin" como sendo uma coisa que todos devem aprender. É o método de obter resoluções rápidas com o auxílio de muitas pessoas, o método do bom trabalho de comitê. Na União Soviética, os jovens de talento, que se sentem inclinados para a política, estudam cuidadosamente esse método.

Poucos dias depois daquela conferência pude compreender melhor esse método. Minha impressão era a de que Stálin, Voroshilov, Kaganovich e os demais haviam concordado numa determinada linha de ação. Mas o tempo transcorria sem que viesse uma solução. A conferência chegou a parecer-me quase um sonho. Transmiti minhas preocupações a um conhecido meu, que era russo, e este riu-se de mim: "É assim a nossa terrível democracia, disse-me. É possível que seu caso já esteja realmente resolvido. Mas, tecnicamente, deve ser aprovado por todos os membros do Birô Político, alguns dos quais estão no Cáucaso e outros em Leningrado. De acordo com a rotina, o seu caso será aprovado juntamente com outras resoluções. É esse o nosso modo de proceder costumeiro, pois qualquer dos membros do Birô poderá desejar acrescentar ou modificar algumas dessas resoluções".

Stálin contribui largamente para essas decisões conjuntas. As pessoas que o conhecem admiram nele, antes de mais nada, sua franqueza e simplicidade, assim como sua presteza em abordar os problemas. Posteriormente apercebem-se de sua clarividência e objetividade na análise dos assuntos. Não existe nele nada da histeria emotiva de Hitler nem da egolatria jactanciosa de Mussolini. Não faz nenhum esforço para fazer sentir o seu domínio. Gradualmente, a pessoa apercebe-se de sua penetrante capacidade de análise de seus colossais conhecimentos, de seu domínio sobre a política mundial, de seu desejo de enfrentar os fatos e, especialmente, de sua visão perspectiva, que situa o problema dentro da história, julgando não só seus fatores imediatos, como, também, seu passado e seu futuro.

A ascensão de Stálin ao poder realizou-se lentamente. Principiou muitos anos atrás com seu estudo de história e, particularmente, de história das revoluções. O presidente Roosevelt, em nossa palestra, comentou com surpresa o profundo conhecimento de Stálin sobre a revolução de Cromwell, que foi posto em foco em sua conversa com H. G. Wells. É que, na realidade, Stálin estudou a história das revoluções da Inglaterra e dos Estados Unidos muito mais a fundo do que costumam fazê-lo os políticos ingleses e norte-americanos. A Rússia czarista caminhava para a Revolução. Stálin tinha a intenção de participar dela e ajudar a dar-lhe forma. Transformou-se num autêntico homem de ciência quanto ao conhecimento do processo histórico segundo o ponto de vista marxista: como vivem as massas do povo; como se desenvolvem a técnica industrial e as relações sociais; como surgem e lutam as classes sociais; como alcançam êxito etc. Stálin analisou e comparou todas as revoluções do passado. E, além de tudo isso, além de ser um homem de ciência, é, também, um homem de ação.

A arte de ser dirigente

Nos primeiros dias da Revolução o nome de Stálin era pouco conhecido fora dos círculos do Partido. Em 1923, durante a última enfermidade de Lênin, vários homens cujas opiniões me mereciam confiança disseram-me que Stálin "era o homem do futuro". Baseavam seu parecer no agudo conhecimento que Stálin possuía das forças políticas e no seu trato contínuo dos problemas de organização política na qualidade de secretário do Partido Comunista. Baseavam-se também na sua capacidade para atuar rapidamente, no momento oportuno, e diziam que, até então, no decurso da Revolução, nunca se havia equivocado. Diziam que era homem a quem recorriam os membros responsáveis do Partido, sempre que desejavam uma formulação clara e sintética do que todos eles pensavam. Naqueles dias, Trotsky zombava de Stálin, chamando-o de "medíocre típico". E até certo ponto isso era uma verdade. Stálin mantinha-se em contato estreito com o "homem médio", pois este constitui a matéria-prima da política.

"A arte de ser dirigente disse Stálin em certa ocasião é um problema muito sério. O chefe não pode ficar atrás do movimento porque isto significaria isolar-se das massas. Também não pode avançar com demasiada rapidez, porque isso equivaleria ao contato com as massas". Com estas palavras estava apontando a seus camaradas a maneira de tornarem-se líderes e ao mesmo tempo expressava o seu próprio ideal, que tem posto em prática de forma efetiva.

Há cerca de vinte anos, durante a guerra civil na Rússia, em mais de uma ocasião o instinto de Stálin para captar os sentimentos das grandes massas ajudou os exércitos soviéticos a obter a vitória. Um dos exemplos mais conhecidos desse fato foi a disputa entre Stálin e Trotsky a respeito de um avanço através do Cáucaso do Norte. Trotsky desejava seguir a rota militar mais curta. Stálin fez notar que essa rota atravessava as zonas hostis ocupada pelos cossacos, o que, em última análise, redundava em ser mais longa e mais sangrenta. E escolheu um caminho indireto, através de cidades que contavam com um elevado número de trabalhadores e nas quais o povo ajudou os exércitos vermelhos, ao invés de lhes fazer oposição. Esse contraste é típico e, de então para cá, tem sido ilustrado por vinte anos de história. Stálin está em seu elemento, manejando as forças sociais, como o demonstra o seu recente apelo a uma "guerra popular" na retaguarda dos exércitos alemães. Sabe como despertar a terrível força de um povo enfurecido, como organizá-lo e como conduzi-lo de acordo com os desejos populares.

O mundo começou a ouvir falar de Stálin por ocasião das discussões que precederam o primeiro Plano Qüinqüenal. Os trabalhadores russos não pertencentes ao Partido Comunista começaram a ver em Stálin um chefe durante o primeiro período da espetacular expansão da indústria soviética. Em março de 1930, pela primeira vez, alcançou o papel de líder entre os camponeses, graças ao seu famoso artigo A vertigem do êxito, com o qual pôs um ponto final nos abusos que estavam ocorrendo na coletivização rural.

A democracia proletária

O grande dia de Stálin, quando se revelou o líder de todo o povo soviético, foi ao apresentar o novo Código Político do Estado Socialista, como presidente da Comissão de Constituição. Haviam sido fornecidas instruções a uma comissão de 31 pessoas historiadores, economistas e políticos mais destacados do país para redigirem "a Constituição mais democrática do mundo", com a maquinaria mais eficiente idealizada até agora para expressar a "vontade do povo". Trabalharam um ano e meio, estudando detalhadamente todas as constituições existentes no mundo, não só as dos governos, mas também as dos sindicatos e agrupamentos formados voluntariamente. O projeto que preparam foi discutido, durante vários meses, por todo o povo soviético, em mais de meio milhão de meetings, a que corresponderam 36,5 milhões de pessoas. Como resultado das discussões populares, chegaram às mãos da Comissão de Constituição 154 mil sugestões de emendas. Sabe-se que o próprio Stálin leu vários milhares dessas cartas enviadas pelo povo.

Quando Stálin apresentou seu parecer perante o Congresso dos Sovietes, havia duas mil pessoas no Salão Branco do Kremlin. Num plano mais baixo que meu assento no camarote dos jornalistas estendia-se a platéia abarrotada de deputados ao Congresso; nos camarotes laterais, achava-se o corpo diplomático; atrás, na ampla galeria, havia grande número de cidadãos notáveis, especialmente convidados para o ato. Fora do recinto, dezenas de milhões de pessoas escutavam pelo rádio, tanto nos campos algodoeiros do sul da Ásia Central quanto nas estações de pesquisa das costas do Ártico. Era um momento decisivo na história soviética. Mas as palavras de Stálin foram simples, diretas, tão despidas de formalidade como se estivesse palestrando com alguns amigos junto à lareira. Explicou o significado da constituição, examinou as emendas sugeridas, fazendo uma ligeira discussão das mais importantes.

Dentre mais de uma dúzia das emendas que Stálin discutiu pessoalmente, apoiou as que facilitavam a expressão democrática, repelindo aquelas que poderiam entorpecê-la. Não faltaram, por exemplo, aqueles que achavam que as diferentes repúblicas não poderiam ter o direito de separar-se da união. Stálin afirmou que, muito embora não fosse provável que quisessem separar-se, seu direito a fazê-lo deveria estar garantido pela Constituição, como uma afirmação democrática. Um número considerável de pessoas desejava negar direitos políticos aos sacerdotes, temendo que influíssem indevidamente na política. "É chegado o momento de implantar o sufrágio universal sem limitações" replicou Stálin, sustentando que o povo soviético já havia alcançado o grau de maturidade necessária para saber o que queria.

Uma frase significativa do discurso de Stálin é, nesses momentos, de mais importância para nós que as formas constitucionais e, até mesmo, do que seu funcionamento. Terminou seu discurso com uma referência inequívoca à crescente ameaça nazista na Europa. Falando a 25 de novembro de 1936, antes que qualquer governo europeu enfrentasse o hitlerismo seriamente, Stálin declarou que a nova Constituição Soviética representava "uma condenação ao fascismo e uma afirmação de que o socialismo e a democracia são invencíveis".

Nos anos que seguiram ao Congresso Constituinte, a personalidade de Stálin começou a ser amplamente conhecida. Seu retrato e suas frases alcançaram tal difusão na União Soviética que houve muitos estrangeiros que viram nesse fato uma "idolatria" forçada e insincera. A maior parte das pessoas que conheci na URSS sente realmente uma grande devoção por Stálin, pelo homem que construiu o regime que conduziu o país ao êxito. Conheci pessoas que mudaram temporariamente sua residência, em vésperas de dias de eleições, a fim de ter a oportunidade de votar diretamente em Stálin, no distrito em que era candidato, em lugar de fazê-lo em favor do outro, menos brilhante, de seu próprio distrito.

É impossível desvendar a vida íntima de Stálin, principalmente através de suas relações com as personalidades eminentes que o têm ajudado a forjar a história soviética. Valery Chkalov, o brilhante aviador que fez o primeiro vôo de Moscou aos Estados Unidos, passando pelo Pólo Norte, descreveu uma visita que fez a Stálin em sua casa de verão, onde esteve das quatro da tarde à meia-noite. Stálin cantou muitas canções do Volga, tocou discos de gramofone para que os jovens dançassem, tendo se comportado como um ser humano normal, que descansa no seio da família.

As três mulheres aviadoras, que superaram todos os recordes mundiais femininos com seu vôo espetacular de Moscou ao Extremo Oriente, foram também honradas com uma reunião noturna realizada no Kremlin. Uma delas, Raskova, contou depois que Stálin havia gracejado com ela acerca da época pré-histórica da matrimônio, quando as mulheres governavam a sociedade humana. Disse que, nos primeiros dias do desenvolvimento da humanidade, as mulheres haviam transformado a agricultura na estrutura básica da sociedade e do progresso, dedicando-se os homens exclusivamente à caça e à guerra. E, depois de referir-se aos séculos subseqüentes de escravidão feminina, Stálin acrescentou: "Agora, estas três moças estão vingando os longos séculos de escravidão da mulher".

Creio, porém, que o melhor incidente é o que se relaciona com Maria Demchenko, porque revela o pensamento de Stálin a respeito dos dirigentes e de como se formam. Maria era uma camponesa que concorreu a um congresso agrícola em Moscou e fez um juramento pessoal a Stálin, que se achava sentado num palanque, de que nesse ano sua brigada feminina haveria de produzir vinte toneladas de beterraba por acre de terra. Foi uma promessa impressionante, pois o rendimento médio, na Ucrânia, andava em cerca de cinco toneladas. A promessa de Maria deu lugar, entre os cultivadores de beterraba ucranianos, a uma séria competição que teve ampla divulgação na imprensa soviética. Todo o país acompanhou com entusiasmo a luta de Maria contra uma peste na beterraba e os esforços dos bombeiros locais para combater a seca, tendo que levar vinte mil caçambas de água para o campo. Todos souberam que esse grupo de mulheres teve que limpar os campos de ervas daninhas nove vezes, e oito de insetos. Finalmente, Maria colheu vinte e uma toneladas por acre, enquanto que a melhor de suas concorrentes obteve treze.

Essa colheita constituiu um acontecimento nacional. Maria e seu grupo foram a Moscou fazer uma visita a Stálin, durante as festa do outono. Os periódicos deram-lhes as honras de estrelas de cinema, publicando suas entrevistas em lugar preeminente. Stálin perguntou a Maria sobre o que desejava como recompensa ao seu próprio recorde e por haver despertado o entusiasmo dos demais cultivadores de beterraba. Maria respondeu que a coisa que mais desejava era ter ido a Moscou para conhecer "os dirigentes". "Mas os dirigentes são vocês mesmos´ disse Stálin a Maria. "Não há dúvida respondeu Maria , mas de qualquer forma desejávamos vê-lo."

Seu maior desejo, que foi realizado, era estudar numa Escola de Agricultura.

"Para frente, para a vitória"

Quando a Alemanha lançou seus exércitos contra a União Soviética, muitos estrangeiros surpreenderam-se de que Stálin não tivesse pronunciado imediatamente um discurso para levantar o ânimo do povo. Alguns de nossos periódicos mais "marrons" lançaram a suposição de que Stálin havia fugido. Os habitantes da União Soviética sabiam que Stálin confiava em que eles cumpririam com seu dever e que faria um resumo da situação, tão logo esta estivesse definida. E ele o fez, de fato, pelo rádio, na madrugada de 3 de julho.

As palavras com que principiou foram muito significativas: "Camaradas! Cidadãos! disse ele, como o tem feito com freqüência. Em seguida acrescentou: "Irmãos e Irmãs!". Pela primeira vez Stálin usava em público essas cálidas palavras familiares. Para todos que o escutavam, isso queria dizer que a situação era muito séria; que precisavam estar unidos para fazer frente à prova final e que, mais do que nunca, deveriam aproximar-se e amar-se uns aos outros; queria dizer que Stálin o estreitava em seus braços, vigorizando-os para a tarefa que tinham pela frente. Essa tarefa consistia em suportar com seus próprios recursos o peso do ataque mais tremendo que conhece a História, resistir a ele, dominando-o, salvar o mundo. Todos sabiam que era necessário fazê-lo, e Stálin sabia que o fariam.

Stálin explicou, com perfeita clareza, que o perigo era grave, que os exércitos alemães se haviam apoderado da maior parte dos países bálticos, que a luta seria incrivelmente custosa e que, nesse momento, estava em jogo a alternativa entre liberdade ou escravidão, vida ou morte para o regime soviético. Disse-lhes textualmente: "O inimigo é cruel e implacável. Quer apoderar-se de nossas terras, regadas com nosso suor, para transformar nossos povos em escravos dos príncipes e barões germânicos". Apelou para a "valente iniciativa e inteligência que são peculiares ao nosso povo" que ele, durante mais de vinte anos, havia ajudado a criar. Traçou, com alguns detalhes, o áspero caminho que todos deveriam seguir, cada um em seu próprio campo de ação, e disse que os russos encontrariam aliados entre todos os povos do mundo amantes da liberdade. Terminando, concitou-os a marchar "para a frente, para a vitória!".

Enviando informações de Moscou sobre os acontecimentos ocorridos na madrugada em que Stálin pronunciou seu discurso, Erskine Caldwell referiu-se às imensas multidões que enchiam as praças públicas da cidade, atentas aos alto-falantes e que "continham a respiração, num silêncio tão profundo, que era possível escutar todas as inflexões da voz de Stálin". Em duas ocasiões, durante o discurso, pôde-se ouvir até o cair da água num copo, ao fazer Stálin uma pausa para beber. O absoluto silêncio continuou durante vários minutos depois que Stálin havia terminado. Então, uma mulher disse: "Trabalha tanto, que não tem tempo para dormir. Preocupa-me a sua saúde". É dessa forma que Stálin conduz o povo soviético para enfrentar a prova terrível da guerra.

Ana Louise Strong
Nascida nos Estados Unidos da América. Licenciou-se em filosofia pela Universidade de Chicago. Morreu em Pequim, em 1970, aos 84 anos.

Publicado em A Verdade nº 37

Capitalismo: o que é isso?

As duas referências mais importantes para a compreensão do mundo contemporâneo são o capitalismo e o imperialismo.

A natureza das sociedades contemporâneas é capitalista. Estão assentadas na separação entre o capital e a força de trabalho, com aquela explorando a esta, para a acumulação de capital. Isto é, os trabalhadores dispõem apenas de sua capacidade de trabalho, produzir riqueza, sem os meios para poder materializa-la. Tem assim que se submeter a vender sua força de trabalho aos que possuem esses meios – os capitalistas -, que podem viver explorando o trabalho alheio e enriquecendo-se com essa exploração.

Para que fosse possível, o capitalismo precisou que os meios de produção –na sua origem, basicamente a terra – e a força de trabalho, pudessem sem compradas e vendidas. Daí a luta inicial pela transformação da terra em mercadoria, livrando-a do tipo de propriedade feudal. E o fim da escravidão, para que a força de trabalho pudesse ser comprada. Foram essas condições iniciais – junto com a exploração das colônias – que constituíram o chamado processo de acumulação originaria do capitalismo, que gerou as condições que tornaram possível sua existência e sua multiplicação a partir do processo de acumulação de capital.

O capitalismo busca a produção e a comercialização de riquezas orientada pelo lucro e não pela necessidade das pessoas. Isto é, o capitalista dirige seus investimentos não conforme o que as pessoas precisam, o que falta na sociedade, mas pela busca do que dá mais lucro.

O capitalista remunera o trabalhador pelo que ele precisa para sobreviver – o mínimo indispensável à sobrevivência -, mas retira da sua força de trabalho o que ele consegue, isto é, conforme sua produtividade, que não está relacionada com o salário pago, que atende àquele critério da reprodução simples da força de trabalho, para que o trabalhador continue em condições de produzir riqueza para o capitalista. Vai se acumulando assim um montante de riquezas não remuneradas pelo capitalista ao trabalhador – que Marx chama de mais valia ou mais valor – e que vai permitindo ao capitalista acumular riquezas – sob a forma de dinheiro ou de terras ou de fábricas ou sob outra forma que lhe permite acumular cada vez mais capital -, enquanto o trabalhador – que produz todas as riquezas que existem – apenas sobrevive.

O capitalista acumula riqueza pelo que o trabalhador produz e não é remunerado. Ela vem por tanto do gasto no pagamento de salários, que traz embutida a mais valia. Mas o capitalista, para produzir riquezas, tem que investir também em outros itens, como fábricas, máquinas, tecnologia entre outros. Este gasto tende a aumentar cada vez mais proporcionalmente ao que ele gasta em salários, pelo peso que as máquinas e tecnologias vão adquirindo cada vez mais, até para poder produzir em escala cada vez mais ampla e diminuir relativamente o custo de cada produto. Assim, o capitalista ganha na massa de produtos, porque em cada mercadoria produzida há sempre proporcionalmente menos peso da força de trabalho e, por tanto, da mais valia - que é o que lhe permite acumular capital.

Por isso o capitalista está sempre buscando ampliar sua produção, para ganhar na competição, pela escala de produção e porque ganha na massa de mercadorias produzidas. Dai vem o caráter sempre expansivo do capitalismo, seu dinamismo, mobilizado pela busca incessante de lucros.

Mas essa tendência expansiva do capitalismo não é linear, porque o que é produzido precisa ser consumido para que o capitalista receba mais dinheiro e possa reinvestir uma parte, consumir outra, e dar sequencia ao processo de acumulação de capital. Porém, como remunera os trabalhadores pelo mínimo indispensável à sobrevivência, a produção tende a expandir-se mais do que a capacidade de consumo da sociedade – concentrada nas camadas mais ricas, insuficiente para dar conta do ritmo de expansão da produção.

Por isso o capitalismo tem nas crises – de superprodução ou de subconsumo, como se queira chamá-las – um mecanismo essencial. O desequilíbrio entre a oferta e a procura é a expressão, na superfície, das contradições profundas do capitalismo, da sua incapacidade de gerar demanda correspondente à expansão da oferta.

As crises revelam a essência da irracionalidade do capitalismo: porque há excesso de produção ou falta de consumo, se destroem mercadorias e empregos, se fecham empresas, agudizando os problemas. Até que o mercado “se depura”, derrotando os que competiam em piores condições – tanto empresas, como trabalhadores – e se retoma o ciclo expansivo, mesmo se de um patamar mais baixo, até que se reproduzam as contradições e se chegue a uma nova crise.

Esses mecanismos ajudam a entender o outro fenômeno central de referência no mundo contemporâneo – o imperialismo – que abordaremos em um próximo texto.

Por Emir Sader, no site da Carta Maior

Ciência x Criacionismo




Alguns criacionistas tentam se convencer de que a ciência moderna só chegou até aqui porque iniciou sua caminhada apoiando-se na muleta da religião.

Mas quando examinamos o início da ciência entre os gregos (que não é a ciência moderna, mas sim a Filosofia, a investigação apoiada na razão), vemos que ela surgiu justamente quando se separou dela.

Quando as respostas prontas deixaram de ser verdades absolutas reveladas pelos deuses, quando o mundo deixou de ser simples para se tornar um mistério, foi aí que a ciência passou a existir e caminhar.

E séculos depois, já no período do helenismo, sob Alexandre, o Grande, o desenvolvimento científico alcançou um desenvolvimento respeitável - e note-se que nessa época não existia o cristianismo, o qual, segundo alguns criacionistas modernos, é o grande responsável pelo desenvolvimento atual da ciência (eles querem ser o "pai da criança").

A religião hoje faz cada vez mais concessões à ciência. Esta empurra a religião para dentro de limites cada vez mais estreitos. Interpretações outrora tradicionais dos textos sagrados sofrem constantes revisões para tomar novo fôlego, para se "modernizar" no debate científico. Mas não se sabe quanto tempo ainda duram. Parece que pouco.


Flexibilização da CLT, um canto de sereia neoliberal

O ano é novo, mas o assunto de um dos editoriais do jornal O Estado de S. Paulo em 1º de janeiro é velho, e lesivo aos trabalhadores: a pretendida flexibilização da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

O jornalão paulista atribui, ali, a iniciativa ao relançamento do tema à direção do Sindicato dos Metalúrgicos ao ABC, que estaria envolvido na preparação – juntamente com parlamentares, juristas, economistas e representantes de empresas - de um projeto de lei a ser apresentado à Câmara dos Deputados ainda no primeiro semestre, propondo a relativização da legislação trabalhista, ressalvados os direitos assegurados pelo artigo 7º da Constituição, a pretexto de modernizar a legislação e facilitar os acordos coletivos.

Não é a primeira vez que se fala na flexibilização da CLT. O pioneiro foi o presidente tucano Fernando Henrique Cardoso, que há uma década queria liquidar com a legislação trabalhista, dentro de seu intento de erradicar as conquistas da “era Vargas”. Ele mandou um projeto nesse sentido para a Câmara dos Deputados em outubro de 2001 que, diante da forte reação dos trabalhadores e dos sindicatos, naufragou no Senado.

A flexibilização pretendida por FHC foi uma ameaça a direitos trabalhistas e sociais consagrados na CLT e no artigo 7º da Constituição, permitindo por exemplo o parcelamento do pagamento de férias e do 13º salário, diminuição do salário mínimo, piso salarial, FGTS, eliminação das garantias constitucionais do trabalhador face à automação, aviso prévio de 30 dias, enfraquecimento dos sindicatos e das centrais sindicais etc.

Hoje, como há dez anos, o argumento conservador para jogar a CLT na lata do lixo pretende que o negociado prevaleça sobre o legislado. Isto é, os resultados das negociações entre patrões e empregados estariam acima da lei. Quem acompanha os dissídios coletivos e o pesado jogo de pressões e chantagens envolvido neles pode avaliar o significado negativo que a implantação desse princípio teria para os trabalhadores, dando aos patrões a oportunidade de impor seus interesses e acordos lesivos aos trabalhadores.

O economista Márcio Pochmann, que na época era secretário do Trabalho da Prefeitura de São Paulo, alertava contra a falácia do argumento de que a mudança levaria à criação de mais empregos. Ele citava estudos que já mostravam como “as reformas trabalhistas na América Latina e nos países ricos não geraram postos. Uma mudança como essa criaria uma situação como a do México, em que foram aprofundadas as diferenças regionais”, denunciou.

A comparação entre a evolução na última década da situação nos países que adotaram reformas neoliberais e flexibilizaram a legislação trabalhista e daqueles que seguiram rumo oposto não deixa dúvida quanto à pertinência daquele alerta. Enquanto o México afunda-se no pântano do desemprego e da estagnação, enquanto a Europa assiste a um levante social contra os esforços patronais e oficiais de jogar sobre os trabalhadores os custos da crise, o Brasil encerra os oito anos do governo Lula com a criação de mais de 15 milhões de empregos. É uma diferença notável e que não pode ser minimizada.

Um dos argumentos usados pelo Estadão em defesa da flexibilização esconde mal o principal objetivo deste ataque contra os direitos dos trabalhadores; ele diz que, num “universo empresarial mais complexo” (sem explicar o que isso significa!), é preciso assegurar competitividade global às empresas brasileiras cujos produtos podem perder lugar num mercado mundial onde o trabalho mais barato em nações menos desenvolvidas pode atrair indústrias instaladas no Brasil e levar para lá os empregos dos brasileiros.

É o surrado argumento da globalização neoliberal, uma chantagem que oculta o objetivo real: a redução na renda dos trabalhadores e a desarticulação de sua organização e capacidade de luta.

Não é moderno: é o arcaísmo disfarçado de modernidade. É um canto de sereia que não pode seduzir trabalhadores e sindicalistas. Há dez anos, em condições muitos mais duras e desfavoráveis do que as conquistadas nos oito anos de Lula, os trabalhadores conseguiram derrotar essa ameaça. Se ela se apresentar novamente, vão derrotá-la outra vez e esta é uma imposição para o avanço nas conquistas alcançadas, na valorização do trabalho e do salário e também da continuidade deste modelo econômico que combina crescimento com distribuição de renda e que foi responsável pela crescente melhoria das condições de vida dos trabalhadores desde 2003.


Fonte: Editorial do Portal Vermelho, 03/01/2011 - http://www.vermelho.org.br/editorial.php?id_editorial=854&id_secao=16